O § 3.º do art. 18 da Constituição Federal exige para a criação de estado a aprovação da população diretamente interessada. A redação do dispositivo constitucional bem que deveria ser outra, de forma a não dar margem a interpretações diversas sobre qual a população que deve ser consultada no plebiscito. E tem-se a impressão de que o legislador constituinte até que tentou fazer isso, ao antepor o advérbio “diretamente” ao adjetivo feminino “interessada” que qualifica o substantivo “população”. Mas, se tentou, não conseguiu, pois o legislador ordinário assim não entendeu.
O Congresso Nacional, ao disciplinar o assunto, deu, “data venia”, interpretação desnecessária e equivocada ao que escreveu o constituinte, pois disse, no art. 7.º da Lei de Plebiscitos e Referendos (a Lei n.º 9.709, de 18 de novembro de 1998), que se entende por população diretamente interessada tanto a do território que se pretende desmembrar, quanto a do que sofrerá desmembramento.
Andou mal o legislador ordinário federal, deputados e senadores. Quer nos parecer muito claro que, se fosse para votar toda a população, ou seja, tanto a da área por ser desmembrada quanto a da área remanescente, não seria necessário o advérbio “diretamente” posto pelo legislador constituinte. E se não fosse necessário, não teria sido escrito. Dizer o contrário seria dizer que o legislador constituinte errou ao escrever tal dispositivo da Constituição, pois a lei – diz a hermenêutica – não possui palavras desnecessárias. Logo, se o constituinte já fizera a diferenciação, pondo como pôs o advérbio “diretamente”, qual a razão para o legislador ordinário fazer o que fez? Nenhuma. Equivocou-se o legislador ordinário, ouso afirmar.
Criado está pelo legislador ordinário, ao se dispor a interpretar o que não se fazia necessário, um problema de inconstitucionalidade ou (se alguém assim o preferir) de constitucionalidade. Imiscuiu-se o legislador no que não deveria, respeitosamente, mas com a firmeza e a clareza requeridas o digo. A uma, porque não havia necessidade de interpretação. A duas, porque, se houvesse essa necessidade, caberia ao Tribunal Superior Eleitoral fazê-lo e, por fim, se fosse o caso, ao Supremo Tribunal Federal, julgando a inconstitucionalidade da resolução que veiculasse a interpretação do Tribunal Superior Eleitoral.
“Alea jacta est.” Criado já foi, ainda em 1998, o problema. Agora – ninguém tenha dúvida disso – é apenas questão de tempo para que o Supremo Tribunal Federal seja instado, por ação direta de inconstitucionalidade, a dizer se está correta a interpretação legislativa dada pelo Congresso Nacional, na Lei de Plebiscitos e Referendos. A palavra final será a do Supremo, conforme o art. 102, inciso I, alínea “a”, da Constituição da República. Até lá, as discussões serão muitas. Tomando partido desde já, publico que votarei pelo Estado de Carajás.
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