sábado, 5 de junho de 2010

A vida é uma crônica




Sábado, 5 de junho de 2010, 11 horas. Estou em casa, na minha sala, tentando estudar Direito Tributário, disciplina do curso de pós-graduação em Direito Constitucional. Apenas tento, pois, não sei por quê, estou cansado: não obstante tenha acordado, como de costume, depois das 9 horas, estou cansado e desanimado. Puxa vida, há muito que, embora involuntariamente, tenho-me deixado abandonar, com muita frequência, a um sentimento de inutilidade de tudo, uma vontade mal-agradecida, que não sei explicar. Debito isso à cardiopatia e aos medicamentos que tomo por causa dela. Talvez seja; talvez, não. Sei lá!

De repente, o Daniel, meu filho de 12 anos, abre a porta da sala e me entrega a revista Bravo!, ano 11, n.º 154, edição de junho de 2010, um dos muitos periódicos dos quais sou assinante. Deixando o Direito Tributário, peguei a Bravo! (acho estranho esse título, por ser uma interjeição; embora entenda o porquê da escolha pela editora, ouso discordar como leitor). Comecei a ler, como às vezes faço, do fim para o começo. Na última página, o conto “Chapéu-coco, saia de pregas”, da escritora Ana Santos, que li; na penúltima, o conto “Açúcar”, dela também, que deixei para ler depois.

Bem mais à frente, na página 80 (a página do conto lido é a 98), estas palavras da atriz Clarice Niskier: “Penso a vida de maneira teatral. Por isso, sinto vontade de transformar tudo o que me toca profundamente em teatro.” Achei bonito, interessante e profundo, apesar de simples. Lembrei-me de que vejo motivo para uma boa crônica em quase tudo na vida, embora ultimamente não tenha escrito coisa alguma, exceto petições e pareceres jurídicos, no âmbito profissional, e trabalhos da pós-graduação, na esfera acadêmica. Não é que não tenha tempo, o que não tenho tido é vontade de escrever. Estou de mal com quase tudo e quase todos. Calou-se, momentaneamente, a minha verve. Abrindo e fechando parêntesis, escrevo “verve”, propositadamente, porque já não considero a palavra um galicismo.

Vejo a vida como uma crônica. Claro, pode ser vista também como um conto, um romance. A vida de qualquer pessoa é uma peça literária. Umas são muito bonitas, interessantes; outras são feias, esquisitas, mas todas as vidas são peças literárias. Afinal, que é literatura, senão o mero transpor de indivíduos e fatos da vida real para a ficção? É isso sim, principalmente a crônica, gênero literário que se ocupa da vida real e explora geralmente o lado pitoresco do dia a dia.

Estou com Clarice Niskier, como sempre estive com Clarice Lispector. A vida é uma arte e como arte deve ser vivida: porque é linda, a despeito dos altos e baixos, e, acima de tudo, porque é curta, tanto a do ateu quanto a de quem crê na existência após a morte. Aliás, ser cético, ateu ou coisa parecida não acrescenta mais dias à vida de ninguém: morre fisicamente o ateu como morre quem crê em Deus. A diferença é que, para quem crê em vida após a morte, resta a esperança no plano imaterial. Eu creio na existência do Pai, do Filho e do Espírito Santo, e, por conseguinte, na vida eterna, embora eu seja tão imperfeito e tão fraco.

É isso! Sem plagiar o Pasquale Cipro Neto. É claro!