domingo, 19 de setembro de 2021

Covid lembra cova de defunto e é nome feio

 

Ficar, involuntária e obrigatoriamente, parado é terrível! Eu que o diga, depois de quinze dias de atestado médico e distanciamento social, por causa da covid-19. Febre, tosse, dor no tórax – como se fora nos pulmões – quando tossia, leve rouquidão e garganta inflamada, durante um bom tempo desses quinze dias, foram o meu pesadelo, tanto dormindo quanto acordado, mais acordado do que dormindo. Covid lembra cova de defunto e é nome feio.


Não precisei de ser internado. Consultei-me quatro vezes, duas delas na emergência, mas o tratamento foi feito em casa. Perfurações, outro nome para agulhadas de vários calibres, não faltaram: na emergência e no laboratório. Haja resiliência! O processo foi, como sempre, desagradável, porque minhas veias são muito discretas, quase secretas, aspecto que sobressai mais ainda diante da agulha e do ser de branco que – bondosa, mas sempre assustadoramente – a empunha.


Conquanto já houvesse tomado as duas doses da vacina e, como disse, não tenha sido internado, fiquei deveras preocupado em alguns momentos. A covid – que jamais poderá ser, por quem tenha o mínimo de seriedade, comparada a uma gripezinha –, somente no Brasil, tem levado milhares de pacientes a óbito, de forma traiçoeira, inteiramente inesperada. Paciente que parece estar muito bem, de repente, piora e morre.


A primeira consulta foi na sexta-feira, dia 3 de setembro, mas o abuso do plano de saúde fez que o resultado dos exames saísse somente no domingo, dia 5, ainda assim porque, com febre, tosse e dor no tórax, na manhã do domingo, fui parar na emergência. E, como sempre me atendem mal onde quer que eu vá, lá tive que me aborrecer e reclamar com a firmeza necessária. A médica que me atendeu requisitou novamente os exames requisitados pelo médico anterior, e eu – alto e bom som, vociferando mesmo – avisei que, se não autorizasse logo, o plano de saúde iria ter sérios problemas.


Resultado positivo, atestado médico de quinze dias e vários medicamentos a que se somaram a medicação cardiológica de uso contínuo e os remédios, gratuita e muito zelosamente, trazidos a minha casa por dois amigos advogados. Um trouxe cinco remédios caseiros; o outro, dois remédios da farmácia, industrializados. Tudo isso, é claro, sem cloroquina, hidroxicloroquina nem ivermectina. Ânimo para quase nada e tédio de quase tudo, amanhecia e anoitecia tomando remédios. Penso, contudo, que deu certo. Estou aqui firme e forte, graças a Deus!

quarta-feira, 5 de maio de 2021

Mudanças e as nossas listas no dia a dia

 

Eu, você – todos nós – temos as nossas listas, conscientemente ou não. Refiro-me às listas recomendadas por Oswaldo Montenegro, na música A Lista, obra de cunho existencial e, sem dúvida, uma das mais belas canções do mundo. A Lista me fala, de forma profunda, à mente e ao coração! Creio que o faça a você também, a todo mundo, digo, a todo ser humano em pleno gozo das faculdades mentais, pois é impossível que seja diferente. 

Poderia, entretanto, estar me referindo a outras listas. Por exemplo, à lista dos bons e à lista dos maus, às quais nos remetem, respectivamente, mas não necessariamente nesta ordem, A Lista de Schindler, de Thomas Keneally, e a Lista Negra, de Jon Bokenkamp. Sim, por que não? Todos nós, reconheçamos ou não, temos inúmeras listas. E, para ficarmos aqui apenas em duas dessas tantas, vale a pena refletir sobre o alcance e a finalidade das nossas listas a que nos remetem ambas, A Lista de Schindler e a Lista Negra. 

Como disse, porém, refiro-me às listas que nos encomenda Oswaldo Montenegro, precisamente à dos amigos e à dos sonhos, com os respectivos desdobramentos. Puxa vida, as minhas são enormes, quase intermináveis! E as suas, leitor? Ouça a canção ou, na impossibilidade de fazer isso, leia o poema de Oswaldo Montenegro. Caramba, fenomenal! Daria – aliás, dá – para escrever vários tratados. A cada minuto passado, já não somos quem éramos. Mudamos muito, o tempo todo, do nascimento até a morte. 

A vida tem-me ensinado muito sobre todos os aspectos, não raro, a duras penas. E, muitas vezes, tenho o terrível sentimento – talvez ingrato também – de que isto ou aquilo me foi ensinado demasiadamente tarde por ela. Dúvidas e sentimentos existenciais que violentamente me sacodem, movem e locomovem as convicções. Tenho, cada dia mais acentuadamente, muitas dúvidas das muitas certezas de muitos por aí afora, assim como tenho muito medo dos donos da verdade. 

Faça suas listas. E, mais do que isso, aprenda com elas.


domingo, 21 de fevereiro de 2021

Responder sabiamente ao idiota ou insensato

 

Conta-se que um mestre da sabedoria oriental caminhava em meio à floresta com um de seus discípulos, quando, a certa altura da caminhada, o discípulo pergunta: “Mestre, qual o segredo da felicidade?” O mestre lhe responde: “Não discutir com idiotas.” Ele, contudo, contesta: “Não concordo que seja esse o segredo.” E o mestre, sem titubear, irônica e sabiamente, dá-lhe uma resposta acachapante: “Você tem razão.” 

Idiota na acepção aí empregada é o indivíduo que a Bíblia chama, dentre outras formas, de insensato. Infelizmente, a vida nos prova que existem mais idiotas (insensatos, se assim o leitor preferir) do que se pode imaginar. Eles perigosamente se espalham, ninguém duvide, por todos os lugares e segmentos da atividade humana. O pior, porém, é que, ignorando a própria idiotice ou insensatez, jamais mudarão: nunca deixarão de ser idiotas. 

Não é só isso. Um dos grandes problemas da humanidade é que, não raramente, o idiota quer se passar por sábio, como no caso do discípulo citado, e aí as coisas sobremaneira se complicam. Pior somente o bandido que se traveste de autoridade e de defensor impoluto e destemido do interesse público. Empiricamente, ou seja, de longa e sofrida experiência, conheço bastante esse tipo de gente, tanto o idiota quanto o bandido, afinal, estou há mais de quatro décadas no serviço público. 

Conheço indivíduos descarados que se dizem, com a maior veemência e os mais convincentes rapapés, defensores legítimos do povo e do interesse público (é sempre destes, não é, leitor?). Só que, na mais triste realidade, são desonestos a não mais poderem e defensores tão somente dos mais espúrios interesses próprios. Não é sem razão que estou cansado. 

Há muito, a fábula do beija-flor que joga a sua gota de água no incêndio da floresta já não me alenta, só faz aumentar a minha indignação. Se me fosse permitido dar um conselho ao engajado beija-flor, adverti-lo-ia de que, além de nada conseguir fazer com sua gotinha de água, ainda corre o sério risco de, por exaustão ou mesmo por acidente ou descuido, cair no meio do incêndio e morrer queimado. 

A fábula do beija-flor e o incêndio não forma, moralmente deforma na medida em que distorce a situação. Cada um evidentemente tem que fazer a sua parte, mas a culpa e a responsabilidade pelo incêndio não são do beija-flor nem dos outros animais. O incêndio deve ser apagado por quem tem a capacidade e a obrigação de fazer isso, não pelo beija-flor e os outros desventurados animais da floresta em chamas. O que passa disso é só engodo, enganação à guisa de ensinamento moral. 

Com efeito, diz a Bíblia, no livro de Provérbios, capítulo 26, versículos 4 e 5, na tradução nova versão internacional (NVI): “Não responda ao insensato com igual insensatez, do contrário você se igualará a ele. Responda ao insensato como a sua insensatez merece, do contrário ele pensará que é mesmo um sábio.” 

Mandou bem o velho mestre oriental.