quarta-feira, 8 de junho de 2011

Plebiscito de Criação do Estado de Carajás: População Diretamente Interessada

  
Diz a Constituição Federal de 1988 (artigo 18, parágrafo 3.º): “Os Estados podem incorporar-se entre si, subdividir-se ou desmembrar-se para se anexarem a outros, ou formarem novos Estados ou Territórios Federais, mediante aprovação da população diretamente interessada, através de plebiscito, e do Congresso Nacional, por lei complementar.” Portanto, a criação de um estado passa, necessariamente, por quatro aprovações distintas: duas do Congresso Nacional, uma da população diretamente interessada e outra do presidente da República.

A primeira aprovação é ato do Congresso Nacional, composto pelos deputados federais e senadores, e consiste na autorização do plebiscito, por decreto legislativo. A segunda, o plebiscito, é ato da população diretamente interessada. A terceira, novamente ato do Congresso Nacional, consiste na aprovação do projeto de lei complementar da criação propriamente dita, se o resultado do plebiscito foi favorável. A quarta, sanção do projeto de lei complementar aprovado, é ato do presidente da República.

Poderá, ainda, conforme o caso, haver mais uma aprovação – que, assim, será a terceira do Congresso Nacional, quinta e última do todo – o que somente ocorre se o presidente da República vetar o projeto de lei complementar de criação do estado e o Congresso Nacional rejeitar o veto. Nesse caso, a lei obrigatoriamente deverá ser promulgada pelo presidente da República ou, se este não o fizer, pelo presidente ou vice-presidente do Senado Federal, uma vez que a rejeição do veto transforma automaticamente em lei o projeto de lei vetado.

A criação do Estado de Carajás já logrou passar pela primeira das quatro aprovações, autorizada que foi a realização do plebiscito. O problema agora – que não deveria existir (e, de fato, não existe) – é saber quem é a população diretamente interessada. Por paradoxal que pareça, o problema existe, mas não existe.

O problema existe porque o Congresso Nacional, ao aprovar a Lei de Plebiscitos e Referendos (Lei n.º 9.709, de 18 de novembro de 1998), disse, no artigo 7.º, que se entende por população diretamente interessada tanto a do território que se pretende desmembrar, quanto a do que sofrerá o desmembramento.

Sempre sustentei – sem querer saber nem me preocupar com a posição de quer que seja – que esses dizeres da Lei de Plebiscitos e Referendos são inconstitucionais, pois, o constituinte, ao pôr propositadamente o advérbio “diretamente”, quis estremar, separar ou distinguir a população da área por ser desmembrada. Logo, o Congresso Nacional, ao dispor diferentemente, cometeu erro grosseiro.

Agora, consultando a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, verifiquei que o problema não existe, pois, antes que o Congresso Nacional, “data venia”, metendo os pés pelas mãos, aprovasse tais dizeres do citado artigo 7.º da Lei de Plebiscitos e Referendos, o Supremo Tribunal Federal, por várias vezes, já tinha decidido que a população diretamente interessada, na consulta popular para a criação de município, é a população da área que será desmembrada e que somente ela deverá ser chamada a votar.

O Supremo Tribunal Federal disse isso em ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) – por exemplo, ADI n.º 733, julgada em 17 de junho de 1992; ADI n.º 478, julgada em 9 de dezembro de 1996; Medida Cautelar na ADI 1.504, julgada em 5 de dezembro de 1996 – referentes à interpretação do parágrafo 4.º do mesmo artigo 18 da Constituição Federal, na redação original, o qual trata da criação de municípios.

O que vale para a criação de município, mudando o que deva ser mudado, vale para a criação de estado. Logo, em última análise, o problema não existe. O artigo 7.º da Lei de Plebiscitos e Referendos, pelo qual toda a população do Pará deveria votar, não haverá de prevalecer, porque é contrário à Constituição Federal. Assim, embora alguns advogados e parlamentares de Belém, há tempo, venham dizendo que toda a população do Pará é quem deverá votar, isso não vai acontecer. Somente nós, da área que será desmembrada, votaremos. É assim que, interpretando juridicamente a Constituição, deverá escrever nas instruções de realização do plebiscito a Justiça Eleitoral, do jeito que o Supremo já disse.   

2 comentários:

george disse...

E se o Pará quisesse incorporar-se, por exemplo, ao Estado do Amazonas, o povo amazonense teria que aceitar isso sem ao menos ser consultado? Pois de acordo com o artigo o estado pode incorporar-se e desmembrar-se consultando a população diretamente interessada.Segundo o seu vê, o povo do amazonas teria que aceitar os paraense se estes quisesse anexar o Pará ao Amazonas.Os amazonense não precisariam ser consultados? Esta é a minha duvida.
Por favor, esclareça-me!

Dr. Valdinar Monteiro de Souza disse...

Rapaz!... Amazonense tem cada dúvida.
Preocupei-me com sua dúvida, Sr. Amazonino. Mas, não se preocupe, não! Isso jamais acontecerá, porque os amazonenses, com certeza, amariam a ideia, mas seria ruim, horrível mesmo, para o Pará. Não se preocupe, se um dia o Distrito Federal quiser ser anexado ao Amazonas, emitirei um parecer jurídico gratuitamente respondendo à sua dúvida.