sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

As piadas do ordenamento jurídico brasileiro


Sou – talvez, na visão de alguns, até insolentemente – um crítico do Estado, não do Estado ideal ou utópico, que é necessário para o bem comum, mas do Estado omisso, corrupto e criminoso, que abandona e desampara à quase totalidade do seu povo. É o caso típico do Estado brasileiro, com sua singular predileção por criar engodos nos mais variados sentidos e apresentá-los como solução eficaz disto ou daquilo.

O Brasil é pródigo em ideias mirabolantes, levadas a efeito tão somente para enganar a quem credulamente acredita nelas. É um inventor de piadas, não raro de mau gosto, que apresenta como se fossem a invenção da roda. Eu já o disse muitas vezes e novamente o digo agora: tenho às vezes vergonha de pertencer duas vezes ao Estado, como agente público e como governado, uma vez que Estado é, na definição mais simples, povo, governo e território.  

É comum, por exemplo, a criação de leis que nada resolvem, embora sejam apresentadas com estardalhaço. Criam grandes expectativas, mas não passam disso, porque, concebidas sem a seriedade necessária, não são feitas para resolver, mas apenas para enganar mesmo. Cito, por exemplo, a Lei dos Juizados Especiais, o Estatuto do Desarmamento e a Lei Carolina Dieckman. Poderia citar muito mais, mas, para não ser cansativo, além de antipático (para alguns ou mesmo para muitos, quem sabe?), paro por aqui.

Sou advogado e sei o que digo. Os juizados especiais, tanto os cíveis quantos os criminais, criados e apresentados como a solução de quase todos os problemas da Justiça no que se refere à morosidade e outros aspectos mais, há muito estão emperrados, abarrotados de processos, com audiências a perder de vista e a dura realidade: prejuízo para o jurisdicionado. Não funcionam! O Estatuto do Desarmamento vale apenas contra as pessoas de bem: os bandidos continuam armados até os dentes. Não funciona! A Lei Carolina Dieckman trouxe muita expectativa para o leigo, mas, na prática do combate e prevenção de crimes, não traz quase nada. Não vai funcionar!

No caso da Lei Carolina Dieckman – que é a Lei n.º 12.737, de 30 de novembro de 2012 –, criaram-se, com estardalhaço e grande alvoroço, mais dois artigos no vetusto Código Penal de 1940, o artigo 154-A e o artigo 154-B, mas, na prática, repito, nada vai mudar. Sim, não vai: ninguém irá para a cadeia por causa dela. Ela criou mais um tipo penal, com várias hipóteses de incidência, o chamado “invasão de dispositivo informático”, mas a novidade para por aí.

Deixo de tecer maiores comentários por causa da exiguidade do espaço de uma crônica, sem embargo de voltar ao assunto, com outro texto, se for o caso. Fica, contudo, o registro. Se alguém pensava que tal lei levaria criminosos para a cadeia, pode tirar o cavalo da chuva: não levará! A Lei Carolina Dieckman é mais uma piada de mau gosto na seara penal, só isso. Se cadeia resolve ou não resolve, se inibe ou não inibe a criminalidade, isso já é outra coisa.

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