segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

A Constituição, o Povo e o Governo


A colega me pede que escreva para o jornal um artigo jurídico sobre o que me der vontade de escrever, mas de interesse do povo. Quando ela me sapecou esse “interesse do povo”, retruquei na hora por telefone, pois penso que, infelizmente, o interesse do povo não é lá boa coisa. Não quero que ninguém se aborreça comigo, mas, se alguém se aborrecer por isso, sem problema. Fazer o quê? Nunca tive a visão romântica ou simplória que muitos têm a respeito do povo.

Pois bem. Pego a Constituição Federal e lá está, logo no parágrafo único do artigo 1.º, o que já citei e recitei tantas vezes: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.” Leio e, como sempre, penso comigo mesmo: a Constituição, o povo e o governo, eta mistura indigesta. Sei não. Mas, vamos lá.

Não quero discutir aqui o significado desse dispositivo da Constituição no que diz respeito às formas direta e indireta de exercício do poder pelo povo. Quero dizer que não me iludo com o povo, nunca me iludi e cada vez mais meu sentimento de descrença nele aumenta. É verdade! O povo não é flor que se cheire, nunca foi. Basta lembrar quem foi que decidiu soltar um criminoso do pior jaez e, no lugar dele, crucificar Jesus Cristo. É simples. Não gosto do povo, porque ele, queira ou não queira, é o culpado de tudo ou quase tudo, não obstante muitos digam que o povo não merece isso, o povo não merece aquilo. Eu digo que merece. Merece, sim senhor!

O povo é desonesto, as pessoas são corruptas, na sua maioria. É. Muitos ficam indignados quando o prefeito, o juiz, o deputado ou qualquer outra autoridade comete algum delito, principalmente algum ato de corrupção. Ficam indignados, mas não têm razão, porque todos ou quase todos, se estivessem no lugar da tal autoridade, fariam o mesmo, procederiam da mesma forma. Já vi e ouvi muita gentinha sem-vergonha dizer que o político tem mesmo é que fazer o seu pé-de-meia e que, se estivesse no lugar dele, também o faria.

Muitas e muitas pessoas, quando apanhadas cometendo uma infração de trânsito, por exemplo, acham certo subornar o agente de trânsito, para que não sejam multadas. E, se há oportunidade, dão o dinheiro e saem contando como vantagem e, ainda por cima (ou seria por baixo?), chamando o agente de corrupto, de ladrão. Esquecem-se, todavia, de que a todo corrupto corresponde um corruptor, que também é corrupto. O Código Penal pune com a mesma pena, nos artigos 317 e 333, o corrupto passivo (agente público que recebe a vantagem indevida) e o corrupto ativo (particular que a paga). A pena é de reclusão, de 2 a 12 anos, e multa.

O povo não tem razão, coisa nenhuma, porque é o maior culpado pelo desamparo genérico do Estado, pelos desmandos e atos de corrupção. As autoridades, como um todo, são constituídas – é por isso que existe a expressão “autoridades constituídas”. Todas as autoridades são constituídas, direta ou indiretamente, pelo povo. É isso o que diz a Constituição, no artigo e parágrafo acima citados. É também por isso que se diz que o povo tem o governo que merece.

Não existe autoridade trazida por disco voador ou coisa que o valha. Todas as autoridades – as que lavam as mãos como Pilatos e as que não as lavam, assim como as que as sujam no proceder ilícito, ilegal ou imoral – nasceram, mamaram, cresceram e foram constituídas, direta ou indiretamente, pelo povo, que as mantém. É por isso que eu não gosto do povo, não gosto, não. Ele cria e alimenta os corruptos e todos os demais tipos de criminosos. As eleições de 2012, como têm sido as demais eleições de todos os níveis, que o digam.

2 comentários:

Joyce Ikeda disse...

Caro, amigo.
Aceito como válida sua opinião a respeito do conceito que tens sobre o povo, porém, dela descordo. Primeiramente, faz-se necessário refletir sobre a frase "todo poder emana do povo". Acredito que o colega já tenha iniciado a leitura do meu tcc, por isso não é necessário dizer que a participação do povo no poder é quase nula. A democrácia liberal, ou seja a democracia burguesa é limitada, onde a participação política do "povo" resume-se ao ato de votar. A cultura política no Brasil é quase inexistente, nossos "representantes", quando candidatos, assumem discursos construídos, pensados para angariar o maior número de votos possíveis, e, por mais que digam muito, tudo e todo o discursos, não significam nada. É como diz o ditado: "Em terra de cego, quem tem um olho é rei". A nós, que sabemos um pouco mais do que os demais, cabe o papel de praticar a conscientização dos outros, os quais não têm a leitura do mundo da forma que nós temos, falar sobre as coisas erradas que existem no mundo e de suas origens, é um ato quase de amor ao próximo,independente de nossas posições políticas, praticar a conscientização política, é libertar o próximo da ignorancia. Os casos de corrupção aos quais o colega refere-se não são ocasionados apenas pelos erros do "povo", mas também ocorre devido a nossa omissão enquanto pensadores, enquanto intelectuais. Aguardo sua resposta.

Dr. Valdinar Monteiro de Souza disse...

Muito obrigado, Joyce, pela leitura do artigo e, principalmente, pelo seu comentário. Volte sempre e comente. Os comentários, favoráveis ou contrários, serão sempre bem-vindos.

Refiro-me, neste artigo e nas minhas demais manifestações sobre o assunto, é ao lado sem-vergonha e corrupto natural do povo, que o faz trocar, com uivos de histeria, o Cristo inocente pelo criminoso Barrabás, que o faz escolher governantes corruptos, que o faz mentir, omitir, adulterar, falsificar. O que você me diz sobre a maioria esmagadora que votou em Jader Barbalho nas eleições passadas, mesmo depois de a Justiça Eleitoral declará-lo inelegível por atos de improbidade e cassar-lhe o registro de candidatura? O que você pensa ter pesado mais aí nessa votação, escandalosamente vergonhosa para nós, os paraenses, foi o discurso bem construído e bem pensado do candidato corrupto ou foi o lado corrupto e sem-vergonha do povo?

A Justiça Eleitoral, no caso Jader Barbalho, fez muito bem a parte dela. A mesma coisa temos que dizer do Supremo Tribunal Federal, quando, salvaguardando a Constituição Federal, não aplicou a Lei da Ficha Limpa àquelas eleições. Quem agiu erradamente foi o povo que elegeu um indivíduo sabidamente corrupto, independentemente de a Justiça Eleitoral negar-lhe ou não o registro de candidatura. Meu pai era analfabeto, mas tinha probidade a toda a prova e seria incapaz de cometer tamanha safadeza.

Outra coisa. Não me vejo omisso, como pensador e intelectual, até porque faço a minha parte, na medida do meu alcance, como, por exemplo, escrevendo na imprensa, ainda que artigos medíocres, sobre o assunto. Assim, posso ser medíocre, mas não sou omisso. A omissão é o refúgio dos fracos, quando não dos covardes; eu não sou fraco nem sou covarde. O povo não é flor que se cheire e tem, por isso, o governo que merece ou merece o governo que tem.

Quanto à leitura do seu trabalho de conclusão de curso, ainda não a iniciei. É que quero lê-lo com vagar, com muita atenção. E vou fazê-lo, garanto-lhe. Até porque, não tenho dúvida, terei muito que aprender e ganhar com isso.