sábado, 14 de novembro de 2009

A cor do sangue, a cor da vida, a cor da paixão



Peguei uma carona com Moacyr Scliar, na leitura cotidiana do site da Academia Brasileira de Letras e, para dar título a minha crônica, tirei do seu conto “A guerra das rosas” as expressões “a cor do sangue, a cor da vida, a cor da paixão”. Sangue é vida, vida é paixão e paixão é vida, como vida também é sangue. Pelo menos eu penso assim, pois, sonhador insensato talvez, sempre ponho, apaixonadamente, alma e coração em tudo o que faço e que vivo.

Talvez porque meu conceito de paixão seja diferente, gosto muito dessa palavra, de seus cognatos e derivados. Tenho paixão por muitas coisas, pessoas, lugares e instituições. Paixão interesseira? Às vezes sim, às vezes não. Correspondida? Às vezes sim, às vezes não. Paixão, na boa acepção, como é do meu costume dizer, se é que existe a acepção má, pois o mal está mesmo é na mente e no coração das pessoas.

Faço, a propósito, uma citação de Umberto Eco, tirada de seu artigo “A arte perdida da caligrafia”, que li na versão eletrônica da Revista Cultura, edição 28 (novembro de 2009), onde ele diz belamente: “As pessoas não viajam mais a cavalo, mas algumas fazem aulas de equitação; existem iates motorizados, mas muita gente é tão devotada à arte de velejar quanto os fenícios de três mil anos atrás; há túneis e ferrovias, mas muitos ainda apreciam caminhar a pé por passagens alpinas; há pessoas que colecionam selos na era do e-mail; e exércitos vão à guerra com rifles Kalashnikovs, mas também organizamos pacíficos torneios de esgrima.”

Isso aí tudo é, para mim, exemplo de paixão. Também de vida, de sangue e de morte. Pode haver paixão mais intensa que a que leva os homens à guerra? Pode haver mais sangue (acompanhado da morte, porque derramado, infelizmente) que na guerra? É má a paixão que faz guerrear? Haveria guerra justa? Sei lá! Depende do contexto e da perspectiva, pois, como já se disse, com sabedoria, “o mesmo cubo pode servir de pretexto para efeitos de sombra e de luz”.


Sou apaixonado pelo meu passado, pelos meus amigos e amigas, pelas coisas boas e belas da vida, dentre as quais sempre faço questão de ressaltar a mulher, a fêmea (com profundo respeito e carinho o digo). Aliás, ao pudibundo ou à pudibunda, que cora ao ler o que escrevo ou ao me ouvir dizer “fêmea”, lembro que Jesus Cristo, sem ser pecador e, muito menos ainda, o devasso presunçoso que alguém pode julgar que eu seja, disse nos Evangelhos de Mateus e de Lucas, a respeito do homem e da mulher, que Deus ou o Criador “os fez macho e fêmea”.


Tenho paixão pelo passado, meu e dos meus amigos, sem negligenciar o presente, o que, com efeito, me faz sofrer diante de frases como esta, recebida por e-mail, de uma amiga a quem sempre admirei muito: “O casamento acabou e por isso cada um deu o rumo que quis dar para sua vida.” Ele se casou novamente. Ela continua solteira, certamente por opção, pois é muito linda, elegante, inteligente, bem-educada.

Situações e decisões como essa devem ser respeitadas, notadamente por quem se diz amigo, mas não deixam de me fazer sofrer, porque me provam cruelmente a falibilidade do homem e dos seus projetos. Pode haver projeto mais lindo e mais auspicioso do que o casamento? Não, não pode. Mas, ainda assim, todos os dias casamentos se acabam e esperanças são malogradas! Por que as coisas são assim? Compreendo, mas não me conformo: nós, os humanos, a despeito da racionalidade (seria por causa dela?), somos tristemente voláteis!

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