quarta-feira, 27 de maio de 2009

VER A PRAÇA, OLHAR O RIO

Alguns lugares de Marabá são agradáveis, bons de se ver e estar, muito embora até possam não ostentar o requinte e o glamour dos similares em grandes centros urbanos: praças, ruas, avenidas, casas comerciais, prédios que já podem ser vistos como antigos, igrejas, escolas e outros prédios públicos. Também os tem sem similares, os rios Itacaiunas e Tocantins. Que dizer, por exemplo, da Casa da Cultura? E da arborização da escola do Serviço Social da Indústria (Sesi), cujos eflúvios são sentidos já de longe pelo transeunte das imediações?

Sem prejuízo da beleza de tantos outros, gosto da praça Duque de Caxias, da praça São Félix, das alamedas de bambus que vão se formando – a principal delas já tem nome aprovado por decreto do Poder Legislativo, que é via Manoel Machado Gonçalves (Maneco) – e da orla Sebastião Miranda, na Marabá Pioneira, que para mim é apenas Marabá, sem “Pioneira”, “Velha” ou adjetivação outra. Também das sumaúmas, ipês, jatobás, pequiás, patas-de-vaca, açaizeiros e outros habitantes ilustres da avenida VP-8 (creio que VP é de via principal), na Nova Marabá.

A VP-8 com sua arborização cada vez mais crescida traz-me sempre à lembrança o tempo em que trabalhei na Universidade Federal do Pará, de novembro de 1996 a abril de 1998. Era acadêmico de Direito e servidor do Município de Xinguara cedido à Universidade. Estudava das 14 às 18 horas e trabalhava das 18 às 22. Saía sempre por último do campus naqueles dias (aliás, naquelas noites) e, ao esperar o ônibus que me levava para casa, ficava contemplando, quase sempre muito cansado, as luzes em contraste com a escuridão da noite na imensidão da avenida. Os anos se passaram, as árvores cresceram, envelheci mais de dez anos, a VP-8 e o campus tornaram-se mais bonitos, a violência aumentou e muitas outras coisas aconteceram: naturalmente, nada é como era. Como diz a canção, “a fila anda”. Como dizia Heráclito de Éfeso, conhecido filósofo da Antiguidade, ninguém toma banho duas vezes no mesmo rio. Porque a pessoa já não será a mesma, porque as águas já serão outras. É o jogo dialético da existência, o mobilismo de todas as coisas.

Gosto de ficar na praça Duque de Caxias, principalmente ao entardecer, admirando suas mangueiras, palmeiras, ipês, oitizeiros, açaizeiros e prédios diversos (como Armazém Paraíba, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, banca de revistas do Edvan, Loja Maçônica “Firmeza e Humanidade Marabaense”, Palacete “Augusto Dias” e outros), conversando com amigos, vendo as pessoas que passam a trabalho, estudo ou passeio, olhando jornais e revistas na banca, deixando-me entregar à paz, ao sossego e ao renovar de energias que tudo isso me transmite. Há, todavia, algo muito desagradável e prejudicial, que, há muito tempo faz por merecer o tratamento devido pelas autoridades, uma vez que atenta contra a beleza da praça e o sossego das pessoas: a poluição sonora.

Em certos momentos, a praça Duque de Caixas, como sói acontecer com vários outros pontos da cidade, se transforma em verdadeiro inferno, pelo barulho de comerciantes e flanelinhas. De um lado, os instrumentos sonoros da propaganda nefasta e desnecessária de alguns estabelecimentos comerciais, a desrespeitar (mais do que isso: torturar) o consumidor, que é o principal interessado e a razão maior da existência de todos. De outro, os aparelhos de som dos carros lavados ao lado da loja maçônica, que são ligados pelos flanelinhas em alto volume, de forma desrespeitosa, para se dizer o mínimo. Nem sequer se preocupam com os doentes renais da clínica localizada bem próximo. É o resultado macabro da combinação indigesta do abuso e desrespeito de comerciantes e flanelinhas com o descaso e a omissão das autoridades municipais e estaduais.

Triste e semelhantemente, a orla Sebastião Miranda padece do mesmo mal, sob o véu da inércia, relaxamento e omissão das autoridades de plantão, as quais ignoram a sorte e sofrimento das vítimas, que são de todas as idades: crianças tenras e indefesas, adolescentes, jovens, adultos e idosos da mais avançada idade, sadios ou doentes. O barulho ensurdecedor irrita, tortura e faz adoecer.

Um dia, talvez, alguém, alguma autoridade dentre tantas as que existem e podem fazer alguma coisa tome as providências necessárias. Um dia, talvez, as vítimas de toda a espécie despertem dessa indolência doentia que, moral e politicamente, as acomete e deixem de ser tão pacatas e caladas. Talvez, sim; talvez, não. Sei lá!... Sonho com isso, contudo. Poluição de qualquer natureza é crime e quem comete crime é criminoso. Quem sabe? Talvez um dia ainda valha o artigo 225 da Constituição Federal, segundo o qual todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida.

Gosto de ir à orla Sebastião Miranda, ao findar do dia, e, quando não há poluição sonora, ficar algum tempo para ver contemplativo a beleza do rio Tocantins, os barcos, as aves aquáticas que bailam adejando sobre as águas, a arborização característica e o concreto armado, as casas (algumas bem antigas) da avenida Marechal Deodoro, as pessoas que vão e que vêm. O horizonte, que se estende bucolicamente pela frente e pelos lados, sempre me faz pensar na floresta que aí um dia existiu e não tive a oportunidade de conhecer, bem como nas embarcações e tripulantes que, no passado não muito distante, traziam passageiros e mercadorias de Belém e de outros centros, e daqui levavam passageiros e castanha-do-pará. Calado e absorto, muitas vezes, deixo-me abandonar aos devaneios e pensamentos diversos. É como se a natureza por inteiro, ante o quedar da luz pelo morrer do sol, se aquietasse ajoelhada para conversar com Deus.

2 comentários:

Melos disse...

Caro amigo, foi bom ler seu texto e passear nas palavras pelas ruas e avenidas citadas, relembrar nos faz viver de novo o que um dia foi tão importante e agradável, como me foram os 4 anos ai desfrutados, na praça Duque de Caxias, na Câmara dos Vereadores onde também nos encontravamos e na orla Sebastião Miranda, onde o rio, o céu e a mata nos levam ao infinito.

Dr. Valdinar Monteiro de Souza disse...

Dera, meu caro ou minha cara, muito obrigado pela leitura do meu blog e pelo comentário feito. Não me lembro do amigo ou da amiga. Certamente, me lembrarei da fisionomia, mas não me lembro desse nome. Tentei acesso ao seu perfil, mas não consegui.
Se o amigo ou a amiga me permite, gostaria de sincermente de saber de mais informações a seu respeito, bem como gostaria de poder continuar a tê-lo ou tê-la como leitor ou leitora e seus comentários.
A crônica que você leu e comentou foi escrita especialmente a edição n.º 5 (maio-junho de 2009) da revista "Foco", revista mensal marabaense. Somente quando a revista saiu é que o publiquei nos meus blogs.
Mais uma vez, meu muito obrigado e um abraço todo especial.