A “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar
e divulgar o pensamento, a arte e o saber” é um dos oito princípios com base
nos quais, segundo a Constituição de 1988, o ensino brasileiro será ministrado.
Este princípio – para mim, sem dúvida, o mais belo dentre os princípios que a
Constituição da República ali enumera – está positivado no inciso II do artigo
206 da Carta Magna do Brasil. Positivar, para quem não sabe, é escrever na lei.
Direito positivo é o direito escrito na lei pelo Estado.
Há riqueza
de concisão e profundidade nas expressões desse dispositivo constitucional, cujo
desenvolvimento dá, com efeito, para escrever livros e livros, jurídicos e pedagógicos.
Quero, contudo, falar dele de forma simples, no espaço exíguo de uma crônica,
conquanto isso me seja quase impossível, pela vastidão do que ele representa.
Muitos são, pois, os aspectos do princípio em
questão, cuja análise pode, assim, ser levada a efeito sob as perspectivas diversas
do Direito e da Pedagogia, sem prejuízo de outras abordagens na perspectiva de
outras ciências ou saberes. Aqui darei, no entanto, apenas um sucinto enfoque
sobre o que entendo como notas específicas da liberdade de aprender e da
liberdade de ensinar, com os naturais reflexos sobre as demais liberdades
vinculadas aos demais dizeres do dispositivo, a saber, liberdade de “pesquisar
e divulgar o pensamento, a arte e o saber”.
A liberdade de aprender é, na melhor
expressão, a liberdade de se libertar a si mesmo, de vencer, ainda que muito
parcialmente, a montanha intransponível do desconhecimento ou ignorância. O
conhecimento, o saber de um indivíduo qualquer, por mais sábio que ele seja, é
uma gota muito diminuta no oceano de sua ignorância. Trivial que seja o
dizê-lo, não se pode olvidar a dimensão da ignorância do ser humano. Daí o dizer-se
vencê-la muito parcialmente.
Só é livre quem, no aprendizado que começa
com o nascimento com vida e termina com a morte, educa-se gradativa e
permanentemente. A educação é um processo que, como a morte, tem por termos unicamente
o berço e a sepultura, só assim se lhe pode delimitar quando começa e quando
termina. Aprender, a cada dia, a cada instante, é o mais poderoso processo de
libertação do ser humano.
Só é livre quem se educa sempre e procura
vencer a si mesmo. Não se vigia todo o
mundo o tempo todo. Bem lembrada, pois, a lição de Cícero, em Da República, segundo a qual, perguntado
a Xenócrates o que conseguiam seus discípulos, este respondeu: “Fazer
espontaneamente o que se lhes obrigaria a fazer pelas leis.” Lógico – digo eu –
somente a educação, nas suas mais variadas formas de expressão, tem esse poder.
E a liberdade de ensinar? A liberdade de
ensinar é a liberdade de participar decisivamente na libertação do outro, do
semelhante. O relacionamento entre os seres humanos é a forma por excelência,
num processo contínuo, de busca da libertação e da completude. E o ensinar –
efeito, consequência e continuidade sempre do aprender – é uma das expressões
mais genuínas desse relacionamento entre as pessoas. Ensinar é um ato de amor.
E, por fim, as liberdades de pesquisar e
divulgar o pensamento, a arte e o saber? Bom, pode-se dizer, com efeito, que
são, a um só tempo, modos, consequência e efeito do aprender e do ensinar. Foi
muito feliz, pois, o constituinte no escrever o princípio em questão. Resta a
todos, educadores e educandos, governantes e governados, o desafio de o pôr em
prática.
O poder da educação não se presta para
oprimir, só para libertar.
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