quarta-feira, 27 de abril de 2011

O advogado honesto e o taxista corrupto



A corrupção pode ser ativa ou passiva, mas, ativo ou passivo, o corrupto é sempre um criminoso e deve ser punido. Aliás, embora definidos em artigos diferentes do Código Penal (corrupção passiva, no art. 317, e corrupção ativa, no art. 333), a pena para ambos os crimes é a mesma: dois a doze anos de reclusão, e multa. A corrupção ativa é quando alguém oferece ou promete vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício. E passiva, quando o funcionário público solicita ou recebe, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceita promessa de tal vantagem. Ato de ofício significa obrigação, dever decorrente do cargo ou função.

Pois bem. Aos esquisitos são permitidos todos os despropósitos, concedidas todas as indulgências e dispensadas todas as atenções. Segundo a escritora Ana Miranda, na crônica “Os poetas esquisitos”, essa veleidade filosófica é de um primo dela, Laurence, o qual, por isso mesmo, quer voltar na outra encarnação como esquisito. Penso, entretanto, que nem só os esquisitos gozam de tais regalias. Também os corruptos ou desonestos, notadamente nos dias atuais. Ser corrupto ou desonesto anda em voga, está na moda, embora isso não seja de agora. Rui Barbosa, no seu tempo, já dizia: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.”

Fui procurado um dia desses por um dono de táxi-lotação, sujeitinho desonesto, dos que se julgam mais espertos que todo o mundo. Desnecessário dizer que era a segunda vez que ele me consultava e em ambas estava errado, embora tivesse o direito inarredável de se defender, porque o artigo 5.º, inciso LV, da Constituição assegura aos acusados em geral o contraditório e a ampla defesa. Não tinha, porém, o direito de me insultar ou me ofender, conquanto o tenha feito e me levado, ainda que por um instante somente, a sentir vergonha de ser honesto.

Embora o caso não envolvesse juiz nem delegado, a certa altura da conversa, como eu lhe disse que não dou dinheiro para delegado corrupto, nem para juiz corrupto, nem para corrupto algum, ele retrucou me dizendo que, se eu fizesse tais coisas, minha casa seria bem diferente. E o pior é que ele o fez – mesmo me ofendendo conscientemente – com a intenção de me convencer a ajudá-lo. Como já estava chegando à Câmara Municipal, para começar meu expediente e estava de bem com a vida naquele dia, desci do carro sem dar um murro nele nem a merecida repreensão. Fiquei, todavia, aborrecido e, todas as vezes em que me lembro do caso, minha raiva aumenta.

Mas, tudo bem. Um dia sempre sucede a outro dia e há fenômenos, casos e situações que se repetem com mais frequência do que podem imaginar as veleidades filosóficas. Um dia ele poderá ter outro problema e – descarado como é – arriscar-se a me procurar, até porque, nas duas ocasiões, não lhe cobrei os honorários. Esta é, aliás, a razão por que minha casa não é diferente: deixo de cobrar honorários, quando deveria cobrá-los, e bem caros.   

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