segunda-feira, 20 de abril de 2009

TERRA SEM LEI

Dia 19 de abril de 2009, à noite, vê-se pela tevê que, infelizmente, aconteceu mais um conflito sangrento na zona rural do sudeste do Pará. Segundo a tevê, luta armada entre os sem-terra e os seguranças da fazenda Espírito Santo, zona rural do Município de Xinguara, com oito feridos: sete sem-terra e um segurança da fazenda. Dia 20, pela manhã. Ainda, segundo a tevê, mais uma vez a rodovia PA-150 está interditada pelos sem-terra. Ninguém pode ir nem vir. Puxa vida, que coisa terrível!

Não quero aqui, açodadamente, dar direito a qualquer um dos lados, até porque, como advogado, não posso (até posso, mas não devo) formar juízo e dar razão a qualquer das partes sem o devido processo legal. Se fosse constituído defensor ou acusador por qualquer das partes, faria o meu trabalho, dentro da lei, acusando ou defendo com vistas à vitória no processo. Faria, com zelo, a minha parte. Mas não é disso que se trata.

Quero, contudo (e posso e devo), na condição de cidadão, de pai de família, de filho e morador da região, de advogado, de evangélico, de maçom e, enfim, de homem, repudiar, na mais profunda significação da palavra, a omissão criminosa do Estado, notadamente da unidade da federação Estado do Pará, que há muito se tornou uma terra sem lei, onde imperam a desordem, a violência, o crime de toda a espécie. Mas não somente a omissão da unidade federativa estadual. Também a da União, cuja responsabilidade é a maior dentre as responsabilidades de todos. E, ainda, a do Município, em menor proporção, mas também omisso e culpado.

A Constituição Federal, no artigo 3.º, erige como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, dentre outros:
a construção de uma sociedade livre, justa e solidária; a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais, bem como a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Também, no artigo 5.º e em outros lugares, estabelece os direitos e garantias fundamentais, garantindo, expressamente, dentre outros, o direito à vida e à propriedade.

É preciso entender que nesses direitos e garantias, bem como em todos esses objetivos fundamentais da República (mas, principalmente, nessa “promoção do bem de todos”) estão incluídos os sem-terra e os fazendeiros, e, ainda, todas as demais categorias ou segmentos sociais. O Brasil não é somente dos sem-terra nem somente dos fazendeiros: é de todos os brasileiros. Pelo menos deveria ser. Se não é, lutemos todos para que seja! O Pará precisa deixar de ser, como tem sido ao longo de anos e anos, uma terra sem lei, sob pena de sucumbirmos, de sermos consumidos todos nós. Isso não é retórica: é a realidade dura e ameaçadora de uma desgraça total iminente!

Urge dizer não com veemência e agir com firmeza contra a omissão e a corrupção do Estado, ou seja, dos governantes e do povo. O povo, muitas vezes, é tão culpado, omisso, imoral e corrupto quanto o são os governantes. Muitos dos sem-terra não são anjinhos inocentes, são criminosos e bandidos, mas muitos dos fazendeiros, servidores públicos e outras categorias também. Quando vejo a propaganda do governo do Partido dos Trabalhadores dizer “Pará, Terra de Direitos”, penso, sinceramente, que aí falta acrescentar a palavra “violados”, para que, expressando a triste verdade, fique: “Pará, Terra de Direitos Violados!” Não podemos nos omitir, nos acovardar e concordar com tudo isso.

O descalabro, obviamente, não é só no campo, mas no meio urbano também. Refiro-me, contudo, ao campo. Perguntas que me inquietam: A quem realmente interessa e aproveita toda essa baderna? Quem são os bandidos? Onde estão as pessoas de bem? O que elas estão efetivamente fazendo contra isso? Por que o direito à vida e à propriedade, dentre outros, não são respeitados e garantidos? É preciso combater o latifúndio e a propriedade que não cumpre função social, mas será que só a propriedade que não cumpre função social está sendo invadida ou ocupada? Por que se demora tanto a cumprir as liminares e decisões judiciais, quando são cumpridas? Será que os diretamente responsáveis por todo este estado de coisas já pensaram realmente onde isso pode nos levar a todos?...